Teresa Christensen
As eleições de 2016 estão se aproximando e então comecei a relembrar as eleições ocorridas na minha infância e adolescência. Eram muito diferentes das que hoje se realizam! Assim, é impossível esquecê-las.
Eram grandes festas “cívicas” com tiros, facadas, surras e todo tipo de tramóias para ganhar as eleições. As campanhas mais violentas eram as de Prefeito Municipal, pois os candidatos eram pessoas do lugar ligadas aos clãs locais. Passávamos o ano todo fazendo política e, à medida que a eleição ia se aproximando, o clima ficava cada vez mais tenso.As vezes nossos correligionários chegavam a nossa casa muito machucados, por que as brigas eram grandes. Uma noite, o cabra Chico Leandro, chegou com os olhos roxos de tanta pancada no rosto, e aí, alguém perguntou, compadre,que te botou estes “Ray ban”? Ele prontamente respondeu: foi o FDP do irmão do prefeito. Vou acabar com a raça dele. E por aí ia a coisa toda. Risos, piadas, humor e ameaças de morte...
Os Coronéis, herança da República Velha, apesar de terem perdido um pouco o seu prestigio e do seu poder, continuavam a manobrar o eleitorado, num vale-tudo de favores, compra de votos e de todo tipo de fraude. Mesmo com 15 anos da ditadura Vargas, sem ocorrer eleições, quando da redemocratização em 1945 e a volta dos Partidos Políticos, as coisas voltaram a ser como antes. A política partidária era o grande motivo da existência de muita gente. Não era por motivos ideológicos, mas, por todo tipo de interesses pessoais.
Os principais partidos eram a UDN – União Democrática Nacional , o PSD _ Partido Socialista Democrático e o PTB- Partido Trabalhista Brasileiro. Então, a disputa era muito grande. Grandes comícios aconteciam nas proximidades da data do pleito. As ruas ficavam inundadas de propagandas. Além disso, tinha a “Ala Moça” com uniformes e tudo mais, formada pelos jovens cabos eleitorais. Músicas, refrães, carros com alto-falantes passavam o dia inteiro rodando pela cidade. Os discursos e os ataques pessoais eram violentos.
Quando nossos chefes políticos vinham a Lajes, o banquete era sempre em nossa casa. Cheia de gente, depois do almoço começavam os discursos e as promessas que geralmente nunca eram cumpridas. Lembro-me do caso da construção da Maternidade. A obra começou, porém demorou tanto a ficar pronta que a população passou a chamá-la de “Eternidade”.
A campanha política era uma festa interminável. Não existiam ônibus, então as carreatas como são conhecidas hoje, eram feitas em cima da carroceria de caminhões, que saiam pelas ruas da cidade e para as localidades vizinhas, cheios de eleitores cantando e... Bebendo cachaça. Às vezes caia um ou outro lá de cima, mas, ficava tudo bem. Dizem que o Anjo da Guarda põe a mão debaixo de criança e de bêbado, por isso, não se machucam.
O dia da eleição, então, era muito emocionante. O movimento começava nas primeiras horas da madrugada com a busca dos nossos eleitores na zona rural. Estes, com suas melhores roupas, ao chegarem, ficavam em frente à nossa casa, e, quando abriam as seções eleitorais, já estava tudo organizado: um grupo de jovens se responsabilizava em encaminhá-los, considerando que a maioria (a grande maioria) era analfabeta, apenas assinavam o nome. Nesse meio tempo, era preciso cuidar para que os adversários não cooptassem nossos eleitores e trocassem a cédula eleitoral que já estava pronta. Esse era o momento de grandes enfrentamentos. Então, para evitar o pior, vinha a Força Federal ( um destacamento do Exército Nacional) e ficava de prontidão por toda a cidade, principalmente junto às seções eleitorais, onde aconteciam as brigas e também para dar segurança às urnas para que não fossem violadas.
Antes da apuração, a boataria era grande. Aconteceu isso, aconteceu aquilo! Lembro-me da eleição em que meu tio foi candidato a prefeito. A votação já estava encerrada e a casa cheia de gente, aí chegou um amigo e disse:
- Estão dizendo que o candidato adversário engoliu a chapa (dentadura postiça) ;
Então, alguém prontamente respondeu:
- Se engoliu, já botou, porque agorinha mesmo estava com ela...
Foi uma risada geral antecipando a vitória que seria confirmada às duas horas da madrugada. E dê-lhe festa e foguetões. Francisco de Oliveira Cabral, nosso tio, foi o prefeito durante 15 anos, no tempo do Estado Novo. Era um jovem de 21 anos. Posteriormente foi eleito pelo voto popular. Assim, rivalizando com o nosso prefeito Alcides Vicini, ele também foi prefeito durante 20 anos.
Devo confessar que muitas das minhas lembranças se toldaram, e ao evocá-las, viraram pó como um cristal irremediavelmente quebrado. Porém, não me esqueço do sol queimando; a claridade das ruas; as pessoas correndo; as brigas; a disputa ferrenha pelo poder; a emoção da abertura das urnas, e depois, se Deus ajudasse , a vitória e a festa da posse.
Nota de Cícero Lajes - Teresa Christensen é uma lajense que saiu de sua terra natal ainda adolescente e construiu uma carreira de sucesso em Santa Rosa RS. Professora universitária, com 16 livros publicados na linha da História Horal, exerceu cargos importantes na Educação do Rio Grande do Sul. Teresa é filha de Honório Antunes de Souza e Maria Procópio de Souza, e é irmã de Arilda Antunes, Edna Antunes, Francisco Hélio de Souza, Maria Pereira (irmã de criação), Jório e Antônio Procópio.
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