quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Cordel: A Sorte do Preá (Cícero Lajes)

Cordel: A Sorte do Preá (Autor: Cícero Lajes)

Eu gosto dos animais

Conto até com receio

Um fato mei cabuloso

Num tempo de aperreio

Inventei de ir caçar

Vou contar sem arrodeio.


Num partido de sodoro

Eu avistei um preá

Carreguei a espingarda

Mas quando fui atirar

O preá saiu mangando

Nas garras d'um carcará.


Eu fiquei ali pensando

Que o preá teve sorte

Se não fosse o carcará

Tinha sido a sua morte

Mas fugiu com um amigo

Pro topo de um serrote.


Fui subindo a pedra preta

Um lugar chei de mocó

Chegando na pedra fina

Uma cobra de cipó

Enroulou-se no meu braço

Só falto me dar um nó.


Saí fazendo frecheira

Por cima de pau e pedra

Um garrancho atravessado

Me segurou pela perna

O garrancho levou sorte

E eu levei uma queda.


Cheguei no topo da serra

Avistei o caracará

Eu disse: cê se apronte

Agora tu vai pagar

Quem mandou você fugir

Carregando meu preá?


Quem disse que era teu

Aquele pequeno ser?

É do primeiro que pega

E não daquele que ver

E ainda não vi nada

Que eu não pudesse comer


Quer dizer que tu comeu

Aquele pobre coitado

E ele todo contente

Pensando ter escapado

Ter amigo como tu

É mesmo que eu ter matado


Claro que eu comi

Me diga daí pra cá

Não me venha com mentira

Que tu não ia criar

Eu matei foi minha fome

Morreu Maria Preá.


Pois eu vou denunciar

Na lei Maria da Penha

Só pra você se torar

Nunca mais fazer resenha

Inventar de ajudar

Pra depois descer a lenha.


Me desculpe meu amigo

Lá no céu tem urubu

Se tu ainda tem fome

Lá no chão tem cururu 

Tu na terra tudo come

Tinha mais pressa que tu.


É a lei da natureza

Eu vivo na lei dos homi

É melhor eu estudar

Que não tenho sobrenome

Se for depender de caça

Vou morrer de passar fome.

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