Foto: Cícero Lajes
CACIMBA NO SERTÃO
Batendo o punho da rede
Mãe cedinho me acordava
Por vezes me assustava
Com a resta na parede
Da lamparina com sede
Com sua chama tomante
Do querosene restante
Parecendo nossa sina
Na secura nordestina
Que ninguém tem o bastante
São quatro da madrugada
O burro já relinchou
Levante, a tina secou
Lá no pote não tem nada
E deixe de dar massada
Tem pássaros já cantando
Tu ainda remanchando
Saia dessa sua frágua
E bote dez cargas d'água
Pois o sol já vem raiando
Em meio aquela frieza
Eu aprontava o jumento
Que dormia no relento
Mesmo com nome de alteza
Nem tinha algo de nobreza
E eu colocava a cangalha
Daquelas feita de palha
Botava cada barril
No cabeçote o funil
E partia pra batalha
Bem na garupa eu montava
Para a cacimba rumava
Enquanto tava maneiro
Num trote muito farceiro
Aos beijos da madrugada
Com o som da barrilzada
Compondo junto ao vento
Música pro sofrimento
Dessa cruel caminhada
A cacimba bem sofrida
Com pouca água minando
De longe a lama cheirando
Atraia tudo que é vida
Com disputa permitida
De inseto, homem, animal
Num processo natural
Onde a sede dita a regra
Nossa família se integra
A disputa sem igual
Ligeiro, mas com cuidado
Eu quatro barris enchia
E nisso vinha a agonia
Nos esses de cada lado
Com um barril pendurado
Vendo quase ele cair
Depressa tinha que agir
Para os outros colocar
O quarto quase não dar
Com minha força a sumir
A água chaculejando
No compasso do trotado
Uma trilha de pingado
No caminho ia ficando
Aqui ali um destampando
E eu correndo pra tampar
Dando um ir para parar
O meu burro com bondade
E hoje eu vejo a saudade
Os meus olhos quem minar
Poeta Lino Sapo
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